As melhores férias da minha vida!
Era meu primeiro dia em Paris!
Após um voo muito atribulado, com mais de 3 horas de atraso, já que chuvas torrenciais tinham obrigado a esperarmos em Lisboa a
conexão para Paris, que estava com o aeroporto fechado devido ao mau tempo.
Era meados de outubro e o frio, ao desembarcar em
Paris, avisava que o outono não seria tão deslumbrante quanto se fala!
Tinha ganhado aquela viagem como prêmio da empresa. Motivo
real: ela ganhou muito dinheiro com o meu trabalho e eu tinha perdido alguns
anos de vida devido ao estresse para tentar fazer que a empresa ficasse mais
rica!
Mas vamos aproveitar esse “prêmio”
Um aconchegante hotel, na região do Maine, na rua de
mesmo nome, lembrando muito as ruas de algumas cidades da Espanha e,
principalmente, algumas ruas do centro antigo do Rio de Janeiro, só que muito
bem conservadas. O quarto era de bom tamanho, porém com banheiro minúsculo (acho
que francês não gosta muito de tomar banho!) e uma bela visão da pontinha da
torre Eiffel, encima de alguns prédios centenários, já que meu quarto ficava no
último andar do prédio também centenário.
Abro a janela e um vento frio com algumas gotas de
chuva, molham minha face.
Ao longe, um ruído de trovão me avisa para cancelar o
programa daquela noite: dar uma volta a pé pelos arredores e jantar em um
bistrô. Simples assim!
Descido então comprar um vinho “nacional”, com alguns
queijos, também “nacionais” e organizar um queijos e vinhos naquele quarto de
hotel, a milhares de quilômetros de casa.
Uma coisa me chama atenção. Pendurado no quarto, uma
reprodução de um quadro de um velho peregrino.
Após exagerar um pouco no tal do vinho nacional,
(acreditem, não era Sangue de Boi!), o sono e o cansaço me dominaram e,
adormeci embalado pelos eflúvios de Baco.
Lá por volta das 4h da madrugada, 23h horas no Brasil,
acordei devido ao estrondo de um trovão, que estremeceu o quarto todo, me
levando a pensar nos bombardeios que Paris sofreu durante a guerra!
Levantei, ainda meio tonto, não sei se de sono ou do
pouquinho a mais do vinho e fui à janela.
Raios de Santelmo, cruzavam o céu e seus clarões davam
uma luminosidade lúgrebe aos prédios em frente.
Chovia lá fora e o quarto estava bastante frio pois me recusei a ligar o aquecimento.
De um relance, voltei para a cama e, juro, aquele
peregrino do quadro estava na minha frente!
Por alguma razão não me assustei, pois aquela presença
emanava uma paz e, o sorriso em seus lábios me tranquilizava ainda mais!
Fiquei olhando aquela figura e cada vez mais a paz me
invadia. Com um gesto suave ele levantou seu cajado e o apontou para a janela.
Me levantei e, na janela, ao meu lado, ele falou:
-Você é
Peregrino! O sul é o seu caminho.
Quando dei por mim, estava deitado na cama, o sol
adentrava pelo quarto, indicando que o mau tempo tinha ido embora mas, aquelas
palavras continuavam ecoando em minha mente.
Havia um mapa em minha bagagem, daqueles que todo
turista leva e o estendi em cima da mesa, procurando o sul. Então entendi!
Tomei o meu café da manhã, fui fazer umas compras e,
três horas depois, voltei ao hotel!
Pedi ao consierge do hotel que me reservasse uma
passagem para Biarritz. De preferência naquele mesmo dia. Meio atônito ele
atendeu pois ao ver minha ficha lá estava que eu teria direito a 06 noites.
Subi para desfazer as minhas compras que se basearam
em:
01 mochila;
02 toalhas;
02 pares de meias sem costura;
02 camisetas em dry fit;
01 casaco impermeável
01 boné, também impermeável.
01 cantil
Roupas íntimas, bermudas, tênis e etc. eu tinha trazido
do Rio.
Arrumei a mochila e a minha mala e falei em voz alta
para o Peregrino que já tinha voltado para o quadro (aí eu achei que estava
ficando maluco...)
- Estou indo
para o sul!
Juro que deu a impressão que o Peregrino esboçou um
sorriso.
Na recepção, paguei a reserva do vôo, que o atônito
consierge fez para mim e, mais desconcertado ele ficou ao ouvir o que lhe
falei:
- Tenho mais
cinco dias de reserva! Vou deixar minha mala aqui e volto antes disso!
Fui direto para o aeroporto de Orly e as 14:50h
embarquei num vôo da Air France para Biarritz.
Ao chegar em Biarritz, tive a certeza do que eu fazia
era para ser feito. No aeroporto encontrei um grupo de franceses que iriam
fazer o Caminho de Santiago que, ao me verem somente com uma mochila,
perguntaram se eu ia para Saint Jean. Ao responder afirmativamente, me
ofereceram uma carona, de graça, pois um amigo deles não pode ir e havia uma
vaga na van que eles alugaram!
Coincidência? Sei lá!
Os quase 60 km foram feitos em menos de uma hora e
cheguei já ao anoitecer!
Me despedi dos amigos franceses e, sempre andando sem
rumo, parei enfrente a uma pousada de nome Maison Donamaria que, de novo por
coincidência só tinha uma vaga.
De manhã, via Pirineus (um frio danado) fui para
Roncesvalles (27 km)
Em Roncesvalles fiquei no albergue La Colegiatta,
muito bonito porém muito cheio mas era aquilo que eu estava procurando!
No meu celular, inúmeros chamados de amigos do Brasil,
mas não quis responder, pois eles certamente não entenderiam a minha decisão de
trocar Paris por uma caminhada (diga-se de passagem, a minha esposa até agora
não entendeu!)
Após a cena (jantar) fui dormir, não sem antes tomar
um vinho, também “nacional”
Só dormi tão bem em minha vida na pousada da Vó Maria,
no Caminho da Fé. (coisas dos Caminhos)
O despertar no albergue é através de cantorias do
pessoal que lá trabalha, sendo essa uma forma simpática de mandar você sair que
eles precisavam limpar as muitas dezenas de camas e etc.
Em virtude do frio e das informações que havia geado
nos Pirineus, resolvi voltar para Saint Jean.
No caminho, vários peregrinos olhavam para mim e davam
um sorriso meio de deboche insinuando que eu havia desistido de fazer o caminho.
Mal sabem eles!
Nunca curti tanto uma caminhada e, após três dias,
estava de volta a Paris, para mais desconcerto do consierge.
Foi a melhor viagem de turismo que fiz na vida!
Você teria coragem?.......
só se fosse agora! sei como é essa sensação (ou seria tentação ?). Ano passado, em pleno outono parisiense, me perguntei várias vezes o que eu está cá faze ndo lá. Tão perto do Caminho... juro que só não fiz a mesma coisa que vc pq duas amigas estavam dependendo totalmente de mim (língua e roteiro). Mas que não da para comparar os Pirineus com Paris, isso não da. Os Pirineus da de 10 a 0 . Só quem já andou por aqueles bosques me entenderá .
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