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segunda-feira, 17 de agosto de 2015

DÁ PARA TROCAR PARIS POR PIRINEUS?

As melhores férias da minha vida!

Era meu primeiro dia em Paris!
Após um voo muito atribulado, com mais de 3 horas de atraso, já que chuvas torrenciais tinham obrigado a esperarmos em Lisboa a conexão para Paris, que estava com o aeroporto fechado devido ao mau tempo.
Era meados de outubro e o frio, ao desembarcar em Paris, avisava que o outono não seria tão deslumbrante quanto se fala!
Tinha ganhado aquela viagem como prêmio da empresa. Motivo real: ela ganhou muito dinheiro com o meu trabalho e eu tinha perdido alguns anos de vida devido ao estresse para tentar fazer que a empresa ficasse mais rica!
Mas vamos aproveitar esse “prêmio”
Um aconchegante hotel, na região do Maine, na rua de mesmo nome, lembrando muito as ruas de algumas cidades da Espanha e, principalmente, algumas ruas do centro antigo do Rio de Janeiro, só que muito bem conservadas. O quarto era de bom tamanho, porém com banheiro minúsculo (acho que francês não gosta muito de tomar banho!) e uma bela visão da pontinha da torre Eiffel, encima de alguns prédios centenários, já que meu quarto ficava no último andar do prédio também centenário.
Abro a janela e um vento frio com algumas gotas de chuva, molham minha face.
Ao longe, um ruído de trovão me avisa para cancelar o programa daquela noite: dar uma volta a pé pelos arredores e jantar em um bistrô. Simples assim!
Descido então comprar um vinho “nacional”, com alguns queijos, também “nacionais” e organizar um queijos e vinhos naquele quarto de hotel, a milhares de quilômetros de casa.
Uma coisa me chama atenção. Pendurado no quarto, uma reprodução de um quadro de um velho peregrino.
Após exagerar um pouco no tal do vinho nacional, (acreditem, não era Sangue de Boi!), o sono e o cansaço me dominaram e, adormeci embalado pelos eflúvios de Baco.
Lá por volta das 4h da madrugada, 23h horas no Brasil, acordei devido ao estrondo de um trovão, que estremeceu o quarto todo, me levando a pensar nos bombardeios que Paris sofreu durante a guerra!
Levantei, ainda meio tonto, não sei se de sono ou do pouquinho a mais do vinho e fui à janela.
Raios de Santelmo, cruzavam o céu e seus clarões davam uma luminosidade lúgrebe aos prédios em frente.
Chovia lá fora e o quarto estava bastante frio  pois me recusei a ligar o aquecimento.
De um relance, voltei para a cama e, juro, aquele peregrino do quadro estava na minha frente!
Por alguma razão não me assustei, pois aquela presença emanava uma paz e, o sorriso em seus lábios me tranquilizava ainda mais!
Fiquei olhando aquela figura e cada vez mais a paz me invadia. Com um gesto suave ele levantou seu cajado e o apontou para a janela. Me levantei e, na janela, ao meu lado, ele falou:
-Você é Peregrino! O sul é o seu caminho.
Quando dei por mim, estava deitado na cama, o sol adentrava pelo quarto, indicando que o mau tempo tinha ido embora mas, aquelas palavras continuavam ecoando em minha mente.
Havia um mapa em minha bagagem, daqueles que todo turista leva e o estendi em cima da mesa, procurando o sul. Então entendi!
Tomei o meu café da manhã, fui fazer umas compras e, três horas depois, voltei ao hotel!
Pedi ao consierge do hotel que me reservasse uma passagem para Biarritz. De preferência naquele mesmo dia. Meio atônito ele atendeu pois ao ver minha ficha lá estava que eu teria direito a 06 noites.
Subi para desfazer as minhas compras que se basearam em:
01 mochila;
02 toalhas;
02 pares de meias sem costura;
02 camisetas em dry fit;
01 casaco impermeável
01 boné, também impermeável.
01 cantil
Roupas íntimas, bermudas, tênis e etc. eu tinha trazido do Rio.
Arrumei a mochila e a minha mala e falei em voz alta para o Peregrino que já tinha voltado para o quadro (aí eu achei que estava ficando maluco...)
- Estou indo para o sul!
Juro que deu a impressão que o Peregrino esboçou um sorriso.
Na recepção, paguei a reserva do vôo, que o atônito consierge fez para mim e, mais desconcertado ele ficou ao ouvir o que lhe falei:
- Tenho mais cinco dias de reserva! Vou deixar minha mala aqui e volto antes disso!
Fui direto para o aeroporto de Orly e as 14:50h embarquei num vôo da Air France para Biarritz.
Ao chegar em Biarritz, tive a certeza do que eu fazia era para ser feito. No aeroporto encontrei um grupo de franceses que iriam fazer o Caminho de Santiago que, ao me verem somente com uma mochila, perguntaram se eu ia para Saint Jean. Ao responder afirmativamente, me ofereceram uma carona, de graça, pois um amigo deles não pode ir e havia uma vaga na van que eles alugaram!
Coincidência?  Sei lá!
Os quase 60 km foram feitos em menos de uma hora e cheguei já ao anoitecer!
Me despedi dos amigos franceses e, sempre andando sem rumo, parei enfrente a uma pousada de nome Maison Donamaria que, de novo por coincidência só tinha uma vaga.
De manhã, via Pirineus (um frio danado) fui para Roncesvalles (27 km)
Em Roncesvalles fiquei no albergue La Colegiatta, muito bonito porém muito cheio mas era aquilo que eu estava procurando!
No meu celular, inúmeros chamados de amigos do Brasil, mas não quis responder, pois eles certamente não entenderiam a minha decisão de trocar Paris por uma caminhada (diga-se de passagem, a minha esposa até agora não entendeu!)
Após a cena (jantar) fui dormir, não sem antes tomar um vinho, também “nacional”
Só dormi tão bem em minha vida na pousada da Vó Maria, no Caminho da Fé. (coisas dos Caminhos)
O despertar no albergue é através de cantorias do pessoal que lá trabalha, sendo essa uma forma simpática de mandar você sair que eles precisavam limpar as muitas dezenas de camas e etc.
Em virtude do frio e das informações que havia geado nos Pirineus, resolvi voltar para Saint Jean.
No caminho, vários peregrinos olhavam para mim e davam um sorriso meio de deboche insinuando que eu havia desistido de fazer o caminho. Mal sabem eles!
Nunca curti tanto uma caminhada e, após três  dias, estava de volta a Paris, para mais desconcerto do consierge.
Foi a melhor viagem de turismo que fiz na vida!
Você teria coragem?.......

Um comentário:

  1. só se fosse agora! sei como é essa sensação (ou seria tentação ?). Ano passado, em pleno outono parisiense, me perguntei várias vezes o que eu está cá faze ndo lá. Tão perto do Caminho... juro que só não fiz a mesma coisa que vc pq duas amigas estavam dependendo totalmente de mim (língua e roteiro). Mas que não da para comparar os Pirineus com Paris, isso não da. Os Pirineus da de 10 a 0 . Só quem já andou por aqueles bosques me entenderá .

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